Um racha na base do governo na Câmara jogou por terra a votação da Medida Provisória 595, que reforma a Lei dos Portos. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, encerrou a sessão por volta das 22h de ontem, depois de um tumulto causado por declaração do deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), que apontou "negociações escusas com interessados no texto", afirmando que a medida poderia ser chamada de "MP dos Porcos". Ele também usou a expressão "show do milhão" para insinuar estímulos financeiros a parlamentares na votação, que reclamaram da atitude do colega. Segundo Alves, a sessão foi uma das mais constrangedoras de que participou em seus dez mandatos como deputado.
Como não havia consenso entre os deputados em torno do texto relatado pelo senador Eduardo Braga (PMDB-AM) na Comissão Especial Mista, o embate em torno das declarações de Garotinho acabou servindo de justificativa para que a sessão fosse interrompida. Com isso, exceto por um arranjo regimental pouco usual no Congresso, a MP deverá perder validade no dia 16, pois não haverá tempo até lá para ser votada na Câmara e no Senado.
Se a medida caducar, os únicos beneficiados com o texto serão quatro terminais recém-instalados que estavam à margem da regulação e que foram "legalizados" ao longo da tramitação. São eles Embraport (SP), Portonave (SC), Itapoá (SC), Cotegipe (BA). Apenas o terminal da Embraport, em Santos, que está para ser inaugurado, tem previsão de investimentos de R$ 2,3 bilhões.
Diante dos impasses que a MP provocou entre empresários, governos, parlamentares e trabalhadores do setor, ontem, o deputado Eduardo Cunha (RJ), líder do PMDB, consolidou uma emenda ao texto para tentar reunir pleitos e derrubar alguns pontos defendidos pelo governo. A emenda polarizou o plenário e colaborou com a derrubada da votação da MP.
O líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE), lamentou o fracasso da votação. O texto seria ferramenta importante para o governo alavancar R$ 54,2 bilhões em investimentos no setor portuário, que seria aberto à iniciativa privada.
- O PT queria e quer votar, sem ver problema em perder - disse Guimarães, que cogita a possibilidade de o texto voltar a plenário na próxima semana.
"JOGO MAL JOGADO DESDE O COMEÇO"
Parlamentares atribuíram aos muitos interesses envolvidos e a uma dificuldade do governo em negociar dentro do curto prazo de tramitação da MP a sua provável perda de validade.
- É um jogo que foi mal jogado desde o começo, porque houve um erro no método de negociação - reconheceu uma fonte do próprio Executivo.
Ontem de manhã, a chefe da Casa Civil, ministra Gleisi Hoffmann, disse que o governo não aceitaria que o texto da MP fosse "desconfigurado" e afirmou que não trabalhava com a hipótese de que a MP não fosse aprovada. Durante o dia, a ministra Ideli Salvatti, da Secretaria de Relações Institucionais, também esteve no Congresso, entre outros motivos, para articular a votação da MP 595.
Para aprovar a MP dos Portos, a presidente Dilma pediu ao vice Michel Temer para enquadrar Cunha, lembrando que na época de sua eleição para a liderança do partido, para obter o sinal verde do Planalto, o vice-presidente garantiu à presidente que ele pessoalmente o controlaria. Cunha, porém, reagiu com irritação.
- Não sou liderado por vocês, fui eleito para o cargo! - disse Cunha.
Para o deputado Márcio França (PSB-SP), há avanços no setor portuário que o governo pode promover, mesmo sem a aprovação da MP, como a eventual retirada de um decreto que exige conteúdo próprio de uma empresa para movimentar cargas em um novo porto.
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